Dizem uns que vivemos uma crise de representação do mundo porque não conseguimos, não sabemos comunicar uma visão do real que nos pareça verbalizável, compreensível ou argumentável. Dizem outros que é uma crise da razão porque tal coisa não existe no singular nem segue modelo único para todo o sempre em todo o lado, havendo muitas razões incluindo as que o coração tem e que a dita razão desconhece como pensava Blaise Pascal há quase trezentos e cinquenta anos e até era matemático, físico, cientista e outras artes da razão pura.
Pode ser. É, no entanto, razoável pensar também que não podemos dizer que estamos sempre em crise porque então normalizamos a crise que é coisa contrária à própria ideia de crise; adiante.
Há um campo de jogo de bola em primeiro plano com duas balizas. Do lado direito ergue-se um muro de contenção de terras com grandes contrafortes para que não se rompa; do outro lado existe um muro baixo que também pode ser banco e uma espécie de relvado. Grandes pedras compõe um muro de contenção de terras com um renque de canas em cima. Percebe-se que o campo da bola é um terrapleno subtraído a uma encosta. A rede das balizas está uma ruína. O bloco de cimento pintado de azul da cor dos ferros da baliza parece um brutalismo mas é para evitar que a estrutura caia para frente. Claro que a fixação ao pavimento podia ser mais discreta e eficaz, mas a coisa resolve-se. Andando.
A casa da parede cega iluminada é deveres intrigante. Impõe-se pela sua dimensão, pela forma, pelo inacabado ou mal estimado. A verdade é que ficou visualmente exposta a partir de um ângulo não esperado. Digamos que foi surpreendida assim porque, de facto foi pensada como casa virada para a estrada que lhe passa na frente a uma cota bastante superior à do campo de futebol e para aí chegar teve que arrancar do nível inferior do terreno.
Em suma, a terceira dimensão complica muito a razão das coisas. Gente muito racional como os matemáticos dizem-nos que existem múltiplas dimensões e não apenas três. Prevêem-se tempos difíceis, portanto.
Álvaro Domingues, licenciado em geografia, doutorado em Geografia Humana e professor e investigador na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto.