«Deixámos de construir as cidades para as pessoas e passámos a construí-las para os carros»

O austríaco Hermann Knoflacher, director do Instituto do Planeamento e Tecnologia de Transportes, da Universidade de Viena, defende que a cidade deve ser dos peões. Sem carros e sem poluição. O especialista, que vive numa quinta e vai de transportes públicos para o trabalho, é a favor da cidade sustentável onde as pessoas convivem nas ruas, compram nas pequenas lojas e fazem circular o dinheiro nos bairros sem o entregar às multinacionais.

23.09.2013

Qual é a sua opinião sobre o planeamento das cidades portuguesas?


O que aconteceu em Portugal aconteceu em outros países. Construíram-se as infra-estruturas erradas. Gastou-se mal o dinheiro da União Europeia. Enquanto noutros sítios estão a eliminar as auto-estradas, aqui continuam a construí-las. Esta estratégia põe em risco a economia do país. As auto-estradas não empregam pessoas. Este sistema só favorece as multinacionais. As pequenas lojas são substituídas pelos grandes centros comerciais. O dinheiro deixa de circular no bairro. O que é pago com cartões de plástico nas grandes superfícies sai do país.

 

 

Ter demasiadas estradas e carros é mau para a economia?


Sem dúvida. É bom para a indústria da construção e para a indústria automóvel. Não é bom para os pequenos produtores e comerciantes. Este sistema de transportes rápidos favorece a centralização do poder. O poder centralizado hoje em dia são as multinacionais. As multinacionais controlam os Estados hoje em dia.

 

 

É contra as multinacionais...


Sou a favor da dignidade humana e do respeito As multinacionais são cancros que têm nos seus genes o lucro ilimitado que tudo destrói. Até o ambiente.  

 

 

Fala de «cidades doentes» e «cidades saudáveis». Qual é a situação de Lisboa?


Todas as cidades que são penetradas por carros são doentes. Lisboa não é das piores. Tem pessoas na rua. Seria fácil fortalecer Lisboa com a criação de mais zonas pedonais. Seria uma forma de incrementar a economia. As pessoas gostam de viver em sítios onde não há ruído e perigos, onde têm tudo próximo, onde podem movimentar-se e onde as crianças podem brincar nas ruas. Deveria ser o primeiro passo para a cidade sem carros.

 

 

Que outras sugestões deixa a Lisboa?


É necessário que se alterem as regras de construção. Quando se constroem apartamentos ou centros comerciais salvaguardam-se sempre lugares de estacionamento. Aqui está o cerne do problema. Não deveria ser possível ter espaço para estacionar.

 

 

Mas isso torna difícil a vida das famílias que precisam dos carros para ir às compras…


Numa cidade doente é difícil. Numa cidade saudável não. As lojas estão ali ao pé. Se um novo estilo de vida for adoptado as pequenas lojas vão aparecer.

 

 

Mas são lojas mais caras...


Mas já não se gasta dinheiro com o carro. Não sei qual é a realidade portuguesa mas na Europa central as pessoas trabalham, em média, um a dois dias por semana só para o carro. Trabalham sete semanas por ano só para pagar o carro. Se não trabalharem para o carro podem ter mais sete semanas de férias… (risos) Podem também comprar produtos de melhor qualidade.

Entrevista completa na edição de Outubro.

 

Redacção Jornal Arquitecturas

TAGS: Hermann Knoflacher , Instituto do Planeamento e Tecnologia de Transportes , cidades , planeamento urbano
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